quinta-feira, 14 de junho de 2012

Fragmentos do livro autobiográfico TRANSTEMPO


Por isso, vivi toda a minha vida sonhando. Tanto que, quando consegui entrar em contato com a realidade física, orgânica e visível do ser humano, senti as maiores alucina­ções e sofri também as piores frustrações.
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    É muito difícil, ainda hoje, separar os meus sentimen­tos religiosos, políticos e sociais neste meu processo per­manente de dúvida e conhecimento. É muito difícil classificar-me, codificar-me, identificar-me. 

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Foi na prisão que eu encontrei a minha verdadeira li­berdade. Construindo o meu próprio mundo, eu aprendi a me isolar de tudo e de todos. Aprendi a vencer as circuns­tâncias, a me integrar e a me entregar completamente ao meio ambiente. E como já disse e vou dizer muitas vezes, foi escrevendo que eu consegui exercer a minha mais ínti­ma liberdade.
Fiz da minha cela solitária um universo, do qual bani a minha angústia e povoei de todos os meus sonhos. Nele, comecei a criar as muitas paisagens e nele nasceram os meus primeiros personagens. 

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Depois que comecei a escutar o barulho do silêncio, o espaço foi diminuindo, foi diminuindo aquém das medidas físicas daquele cubículo. Achei então a porta de ferro mais agressiva e intransponível. Pensei que ela, só, fecharia to­do o mundo para mim. Barraria todos os caminhos. O chão de cimento liso, no princípio, pareceu-me uma corda bam­ba. Onde eu não sabia se sentava, se deitava ou se ficava de cócoras ou de pé. Lamentei muito não saber ioga. Mas depois, consegui sentar, deitar e dormir. Meu primeiro so­no foi tumultuado porque o som da conversa dos soldados entrava na cela para me acordar. Como eram propositais para me fazer crer que eu seria fuzilado, o espaço da cela e o frio do chão ficaram logo alterados. O tempo também. Já que eu ia morrer de madrugada, ele deixaria de existir como medida para mim.

Mas depois que eu não morri e os dia se passavam, co­mecei a encarar o espaço e o tempo como dimensões gêmeas. Ai o mundo se alargava. O espaço perdeu todos aqueles li­mites de ferro, pedra e cimento. E a imaginação se soltou. Todas as medidas de espaço e tempo não tinham para mim qualquer utilidade. Porque eu estava aprendendo, na práti­ca, que elas só são úteis quando correspondem ao mundo em que o homem vive. 
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4 comentários:

Elson Ronis F de Almeida Ruach (Ronis Elson) disse...

Lindo, a dimensão do homem não é a circunstância que o limita, mas a sua grandeza de espirito que o faz alcançar os estágios mais profundos do universo. A luz é "transtempo" a nossa caminha tem ser inspirada... Aqueles que tem sonhos nunca ficaram encarcerados no limite da estupidez a alheia. Viva Benedicto Monteiro. Adorei o blog, conhecer este talentoso cidadão foi um convite para entrar numa dimensão de luz de mentes superiores..

Doris disse...

Maravilha!!!
Esse homem estava além de seu tempo. já disse isso muitas vezes para ti amada Wanda, mas cada dia convenço-me disso!!!

Doris disse...

Maravilha!!!
Esse homem estava além de seu tempo. já disse isso muitas vezes para ti amada Wanda, mas cada dia convenço-me disso!!!

( Ironi Ribeiro) disse...

Faço de suas palavras as minhaa.